sexta-feira, 13 de maio de 2011

A SOCIEDADE SEM NOME

 Paulo Matos

É incrível que nossa sociedade em pleno século XXI ainda não atente e não enfrente com inteligência a questão substancial do modelo que escolheu que é a questão do nome.

Do sobrenome é recente, séculos XVI e XVII, quando a necessidade de identificação das pessoas que se multiplicavam e se confundiam restou necessária, movimentando-se então suas profissões e características físicas para denominarem-se – entre outras raízes como alteração dos sobrenomes seculares e familiares dos judeus tornados cristãos novos, perseguidos em função da etnia. Ou a simples adoção o nome dos patrões, como fizeram escravos e tanta gente.

Mas em uma época de pleno individualismo e da ascensão profissional dos seres por sua afirmação pessoal, as pessoas se preparam na vida para desempenhar funções e nelas precisam afirmar-se e definir-se. Não basta a casualidade. Meu nome é esse, fazer o que... Não, não: se será um grande borracheiro, um grande criador de galinhas, um grande dentista ou advogado, não importa a diferença, desde que se afirme esta condição no nome, isto o auxiliará.

Podem ser criadores de coelho e para isso estudam a história dos grandes criadores, suas técnicas, a melhor culinária “coelhal”, roupas a utilizar, tudo para o bem estar dos animais – mas, mais do que tudo, a identidade para ser reconhecido como tal. É a profissão da plaqueta, do símbolo, da identidade, da marca. É o logo, a ideia, onde está um está outro, associação.

Na sociedade gregária, coletiva, submetida ao senso comum necessário em que ninguém vive sozinho e tudo ou quase é coletivo, é necessário ser relacionado na tarefa escolhida. Seja o escolhido a partir da Lista Telefônica. Cada um faz alguma coisa coletiva e pronto. E isso tem que ter nome. Há de ser sonoro, modernamente curto e incisivo, ter boa carga simbólica talvez, mas principalmente intrínseca, forte, marcante. E trazer este nome do berço, escolhido na emoção do nascimento do ser, é duro.

De Vaney, um dos mais brilhantes críticos esportivos do jornalismo brasileiro de outrora, originalmente Adriano Neiva da Mota e Silva, foi um dos primeiros a ver a importância da construção do nome e fez um anagrama, desse nome extenso e valoroso – e polêmico – fez “De Vaney”, que se tornaria lendário. Dizia ele que “as palavras têm peso”. Os sinônimos não são iguais, são similares, sim, mas diferenciados na sua substância, formação. Diria Luiz Carlos Sampaio, engenheiro e sociólogo já falecido, que basta uma alteração nominal ou adverbial e tudo muda.

A ideia tem que ser gravada na transmissão ou não persiste nem insiste, não marca presença, passa batida pela memória se não tiver associação nem ligação ideológica com a atividade. E definida ou planejada esta, você pode e deve sim adotar o nome desejado para seu vôo, sua empreitada, o elo principal entre você e o que faz que será a razão e sua vida.

Não é porque você é João que tem que cuidar de pão, mas será difícil armar-se como cientista titulado José, Zé das Couves, Manoel das Batatas. Conheço alguém que tem um sobrenome inglês, Paul, que assim pronunciam e pensam os demais, mesmo por sua formação profissional e atuação intelectual.

Mas pessoa culta e sem falsas projeções, quando indagada responde na lata que não é o “Paul” inglês do economista Paul Singer nem do artista da música Billy Paul ou do ator e diretor de cinema norte americano Paul Newman. Do integrante dos Beatles Paul Mc Cartney ou do pintor impressionista francês Paul Gauguin – ou mesmo do filósofo existencialista Jean Paul Sartre, o “papa de 1968”.

O seu “Paul” era mesmo de “Paúl”, chiqueiro, como identificavam seu avô em uma época dos sem-sobrenome e que os adotaram. Então ela ficou com este sobrenome, que em uma sociedade de imagens de nossa época certamente nunca pensou em traduzir à raiz, pois que seria evoluir e não o contrário, como o Dr. Gerson Martins propõe a todos – pois o nome é o mais importante dos elementos constituintes da personalidade e da pré-personalidade, ajudando a construir a imagem antecipada dos seres.

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